Há algumas semanas obtive minha certificação emitida pelo CFA Institute e desde então tenho escutado a seguinte pergunta: o que exatamente significa ser um CFA? Objetivamente a sigla CFA, em inglês, significa ‘chartered financial analyst’ - que, em tradução livre, poderia ser entendida como analista financeiro certificado.
Atualmente a certificação é uma das mais completas e reconhecidas mundialmente e é recomendada para profissionais que buscam excelência na área de finanças, investimentos e aos que almejam uma carreira internacional. O título é concedido aos candidatos que completaram o programa gerido pela organização americana sem fins lucrativos CFA Institute.
Composto por três provas e a fase de validação de experiência profissional, o programa completo conta com outras exigências. Para iniciar o processo é necessário ter um passaporte válido, ter concluído um programa de graduação em qualquer área e estar apto a realizar as provas em inglês. Já fui questionado algumas vezes se eu recomendaria obter o CFA ao invés de buscar uma formação em programas de MBA no Brasil ou alguma outra pós-graduação, ainda que elas não sejam equivalentes. Considero que essa escolha seja algo muito pessoal e dependa muito das características e aspirações de cada um.
Um aspecto muito importante e que deve estar claro a quem deseja iniciar o programa é a dedicação de tempo que será necessária. De maneira geral, a recomendação feita por especialistas é que sejam investidas pelo menos 300 horas de estudo para cada uma das três provas. Pessoalmente, precisei dedicar cerca de 1.100 horas para me preparar para as três, um pouco mais do que a recomendação genérica. Minha graduação foi na área de Engenharia Naval, portanto, acredito que tive que dedicar um pouco mais de tempo para me aprofundar em temas que administradores e economistas, por exemplo, já tenham familiaridade ao final da faculdade.
Outro aspecto do programa que considero bastante relevante é o formato da certificação. Diferentemente de outras pós-graduações, o material padrão disponibilizado para preparação é composto apenas por livros de estudo e um ambiente de aprendizagem virtual, com várias ferramentas para o candidato acompanhar sua evolução. Não há vídeos, aulas presenciais, instrutores para sanar dúvidas ou atividades em grupo. Os candidatos que optam por utilizar exclusivamente o conteúdo disponibilizado pelo CFA Institute devem estar preparados para desenvolverem seus conhecimentos a partir de leitura, resolução de exercícios e revisão de exercícios resolvidos.
No site também há um fórum para postar e responder dúvidas, mas não há suporte de instrutores, todos os comentários são realizados por outros candidatos. Recomendo essa opção para pessoas que gostam de ter uma maior autonomia, já que não há necessidade de se comprometer com horários específicos de cursos e, além disso, é a alternativa mais econômica. Porém, o comprometimento e a disciplina necessários para esse estilo de estudo são consideráveis.
Aos que preferem um formato mais tradicional de pós-graduação, recomendo utilizar o serviço de algum fornecedor de conteúdos e cursos especializados para preparação para as provas. As opções vão desde canais com vídeos sobre os conteúdos abordados nos exames a escolas que de fato oferecem aulas presenciais e um suporte mais completo de especialistas no assunto. O melhor formato de preparação depende do estilo de aprendizagem de cada um e de quanto se deseja gastar, já que esses cursos preparatórios são fornecidos por terceiros e não fazem parte do pacote adquirido quando se ingressa no programa.
Considero importante salientar que todas as taxas relacionadas a realização das provas são cotadas em dólares americanos. O padrão é pagar uma taxa para ingressar no programa e posteriormente uma para cada uma das três provas. Segundo informações disponíveis no site do CFA Institute em outubro de 2022, a taxa de ingresso no programa é de US$ 300 e a taxa padrão para realizar a primeira prova, US$ USD 1,200 (o valor para inscrições antecipadas é de US$ 900). Considerando valores médios recentes de cotação do dólar e utilizando um cartão de crédito para pagamento, os valores pagos em reais seriam aproximadamente R$ 1.650 para taxa de ingresso e R$ 6.600 para realizar a primeira prova (R$ 5.000 para inscrições antecipadas). Simplificadamente, a inscrição no programa e realização das três provas pela taxa padrão custaria cerca de R$ 21.500, valor bem competitivo quando comparado a uma pós-graduação na área de finanças em uma universidade de ponta no Brasil.
Apesar de ser um programa exigente e que demanda bastante dedicação, existem inúmeras vantagens aos que obtêm o charter. Em primeiro lugar, há um reconhecimento considerável por empregadores do mercado financeiro tanto no Brasil quanto no mundo. Na minha visão, o certificado pode abrir portas aos que têm interesse em trabalhar com planejamento financeiro e private wealth, bancos comerciais e de atacado, bancos de investimentos, gestão de portfólios, research, consultoria, gestão de riscos e outras carreiras relacionadas.
No Brasil há também o reconhecimento pelos órgãos supervisores para que profissionais graduados pelo CFA atuem em conformidade com as leis brasileiras, mesmo sendo certificados por uma organização americana. A deliberação nº 783 de 2017 da CVM, por exemplo, reconhece o CFA como uma certificação válida para atuar como consultor de valores mobiliários. Além do Brasil, o CFA Institute cita que há 28 territórios com reconhecimento regulatório do programa, dentre eles: Estados Unidos da América, Austrália, Canadá, Alemanha, Grécia, Hong Kong, Irlanda, Reino Unido, Israel, México, Singapura e outros.
Mais importante do que reconhecimento pelos empregadores ou pela legislação, acredito que o maior benefício do programa seja de fato a formação. O conteúdo é extenso e abrange tópicos nas seguintes áreas: métodos quantitativos, economia, análise de demonstrações financeiras e finanças corporativas, precificação e gestão de investimentos de renda fixa, renda variável e derivativos, riscos, gestão de portfólios de pessoas físicas e instituições e, principalmente, ética. Acredito que o programa seja muito interessante para quem tem interesse em buscar uma formação ampla e generalista, pois além de abordar conteúdos muito relevantes, o curso é estruturado para trazer exemplos práticos e cases em praticamente todos os capítulos.
Quando se estuda demonstrações financeiras, por exemplo, há casos para estudo que trazem boa parte de demonstrações financeiras realmente publicadas por uma empresa multinacional e os tópicos abordados no capítulo são analisados conforme um caso prático. Busca-se ter essa abordagem em diversos tópicos tratados e dificilmente algum assunto é analisado de maneira puramente teórica. Mesmo tendo me formado como Engenheiro, já estava muito claro para mim ao final da graduação que meu interesse era muito mais voltado para negócios e investimento do que de fato em engenharia. Por esse motivo, a maior parte dos assuntos abordados na certificação sempre despertou muito o meu interesse. No entanto, algo que não imaginava encontrar no curso era a ênfase tão grande no aspecto ético.
Para ser membro e associado a alguma society vinculada ao CFA Institute, é necessário assinar um termo de comprometimento anual com o código de ética e os padrões de conduta profissional do CFA. Muito mais do que uma formalidade, os membros são educados, formados e incentivados a serem promotores de um mercado mais ético e transparente. O objetivo de promover esse tipo de atuação profissional é fazer com que os impactos gerados pelos investimentos sejam positivos e disseminados pela sociedade. A visão do instituto, com a qual concordo plenamente, é a de que quando há confiança dos diversos atores econômicos nos profissionais das áreas de investimentos e nos mercados financeiros em geral, a sociedade como um todo é beneficiada. Construir essa confiança não se limita a atuar profissionalmente e realizar negócios dentro da lei, mas sim ter uma postura ética que proteja os mercados, os clientes, empregadores e que promova uma atuação profissional de excelência. São valores que acredito que façam toda a diferença nos resultados gerados pelas empresas e organizações e os quais busco na minha atuação profissional no dia a dia.